terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

ESCREVO (Eduardo Monga)

ESCREVO
Eduardo Monga.


Escrevo porque muitas vezes me falta força para chorar
e na ausência de lágrimas, produzo palavras.
                                                   Saem as dores, entram as frases.

A angústia fervilha. Uma enxurrada de sensações.
Eis que estou pronto, senão para escrever,
então que seja para não morrer cedo.
                                                  
Já me sangrei há tempos. Hemorragicamente de palavras.

Era um dia um texto ou uma doença.
Estanquei num papel sujo de bar.
                                                    Pisado de chão e merda.

Era o jeito ali mesmo: palavras sujas para me limpar,
se não fosse isso teria um AVC na manhã seguinte.

Sou ansioso em cuspir minhas dores.
Escarro centenas de paranóias em sete palavras e três adjuntos.

Vou vomitar o que me disseram; requer de tempo ficar curado do mundo.
O fim do amor é um choro de cem páginas,
trezentos parágrafos, cinco mil linhas e vinte mil palavras.
                                             Fora isso restou a febre.

Neste mesmo tempo troquei um romance por um câncer.
Não tinha a quem recorrer, o papel me deu guarita.
Salvei-me com uma boa história.

Escrever é todo dia. Os dias que os dias comem.
                                             Mastigar esta fadiga inquietante.
Escrever é assim, distante.
Como a quem quer se encontrar em si.

Escrevo porque muitas vezes me falta força para chorar
e só me resta escrever.




9 de março de 2010.

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